sábado, 13 de junho de 2015

Deborah Curtis - [Tocando a Distância] Ian Curtis & Joy Division

Por falar em livros, esta semana, devido a um defeito na linha telefônica, que detectei na noite de terça e que me deixou sem telefone e sem conexão até a manhã de sábado (thank you Vivo!), consegui ler dois livros, o primeiro foi Terra em Chamas, o quinto das Crônicas Saxônicas do Bernard Cornwell que estava na fila desde que ganhei de amigo secreto em 2011... e o segundo, sobre o qual gostaria de falar um pouco é a biografia do Ian Curtis e Joy Division escrito pela esposa do Ian, Deborah Curtis.

Ganhei este livro em um sorteio da KissFM no final do ano passado, e assim que o trouxe para casa, meu marido (grande fã do Joy) pegou para ler e sumiu com ele. Como precisava de um livro impresso para carregar na mochila e ler enquanto espero o ônibus (emprego novo, busão novo, e não tenho coragem de sacar meu tablet assim, na rua) revirei a estante e consegui encontrá-lo. Li rapidinho. 


Tocando A Distância - A curta, genial e trágica trajetória de Ian Curtis, vocalista do Joy Division, faz parte daquelas grandes histórias do rock’n’roll. Viveu rápido, morreu jovem e virou mito. Tocando a distância é o relato íntimo, aprofundado e fiel das duas personas do cantor, o mito e o homem, escrito pela única pessoa qualificada para essa missão: a sua viúva Deborah Curtis. Reverenciado por seus colegas (“a voz sagrada de Ian Curtis”, disse certa vez Bono Vox, do U2) e idolatrado por seus fãs, Ian Curtis deixou um legado artístico formidável. Hipnotizante em cima do palco, mas introvertido e propenso a variações de humor na vida particular, Ian cometeu suicídio em 18 de maio de 1980. Essa biografia mostra como Ian Curtis foi seduzido pela glória de uma morte prematura, mesmo com esposa, filha e o iminente sucesso internacional. Considerado o livro essencial sobre esse ícone da era pós-punk, o volume traz prefácios escritos por grandes nomes do jornalismo musical: o inglês Jon Savage e o brasileiro Kid Vinil. O premiado filme Control, de Anton Corbijn, foi baseado nesse livro. A obra ainda inclui todas as letras (algumas inéditas), escritos inacabados, fotos do arquivo pessoal de Deborah Curtis, discografia e a lista de shows do Joy Division.


Se é verdade que toda a história tem três lados: o dela, o dele e a verdade; temos em "Tocando a Distância", somente o lado dela na história. Ela, sendo a esposa de Ian Curtis, Deborah Curtis, namorada de adolescência, que virou esposa e conviveu com ele dos dezesseis anos até sua morte, aos vinte e quatro.

Eu achei o livro pungente, cheio de sentimentos, e compreendi muito do posicionamento dela em relação a tudo o que aconteceu, porém, nem de longe soa como a verdade nua e crua - ou melhor, soa tanto como a verdade nua e crua - que nos faz ter a impressão de que não é a verdade natural, e sim uma racionalização em cima de uma verdade muito mastigada, há muito digerida e reformatada para se encaixar em uma suposta paz de espírito. 
Talvez seja inevitável consequência do que causa o suicídio de alguém próximo, talvez seja resquício da raiva por ter sido traída, não dá para saber ao certo. 

Deborah fala da vida de Ian desde a infância, passando pela adolescência e sua obsessão por fazer parte da cena musical pós-punk que tanto gostava. Suas tentativas de formar uma banda, o relacionamento com amigos, as experimentações com drogas, os ataques de frustração, revolta e ciúmes, a tentativa de suicídio na adolescência...  Fala de um jovem desajeitado, solitário, inteligente, mas de certa forma, manipulador e um pouco alheio às pessoas ao seu redor, com profundo poder de empatia por desconhecidos, mas frio e distante de quem lhe era mais próximo. Teimoso e focado, cheio de planos para o futuro da música, mas muito pouco focado no lado prático da vida, como foi até o fim. 
Nos debatemos pelas páginas entre a compreensão e respeito por um exacerbado instinto artístico (ah, eles são tão extravagantes, e podem tudo!) e o forte sentimento de que aquele homem era, antes de tudo, um egoísta! Pobre esposa.... Mas aí entra aquela coisa: falta o lado dele na questão (e claro, faltaria também, sempre, a verdade).

Foi interessante acompanhar o surgimento do Joy Division (anterior Warsaw), desde o embriãozinho na mente do Curtis, compreender a inspiração para algumas letras (insisto que não sou profunda conhecedora da cena musical dos anos 80, mas sou uma curiosa entusiasta) e apesar do azedume de algumas passagens devido à condescendência da esposa, foi possível reviver alguns dos shows e cenas com base na narrativa da Deborah. 

Ian Curtis, fosse pela sua doença (ele foi diagnosticado com epilepsia e depois de casado tinha ataques epilépticos constantes - inclusive no palco) ou pela depressão (e atração pela morbidez) que aparentemente o acompanhou vida afora, foi uma pessoa atormentada (góteco!) e nada fácil de se conviver. Ambos eram muito jovens, e depois do nascimento da filhinha, Natalie, as coisas podiam - deviam, talvez - ter mudado, com o tempo (quando ele se suicidou, ela tinha pouco mais de um ano). Talvez se ele não tivesse se suicidado em 18/05/1980, enforcando-se no chão da cozinha para a esposa encontrá-lo, talvez tivesse chegado a uma maturidade, uma vida minimamente suportável, confortável... mas desistiu antes, e todos ao seu redor se surpreenderam. O livro é recheado de "ninguém diria!" "se ao menos tivéssemos visto os sinais". Cheio de culpa. E de resignação. 

Tenho nojo de homem que trai. Aliás, tenho nojo de gente que trai. Já fui mais cabeça aberta em relação a isso, já compreendi, já filosofei, mas acho que quando a gente assume um compromisso para a vida toda (mais do que para com a outra pessoa, mas para conosco mesmos), a gente tende a se recobrir com uma carapaça que é até uma forma de auto-proteção. Sei que estou errada, que trair é normal, que não é um fim de mundo. Mas lá dentro, o meu astronauta interior (lá no fundinho de minha mente) grita: Mas caramba! O cara todo estropiado, ainda fica dando brecha pra groupie. Filho da puta, francamente, viu!!!"
Mas ei, essa sou eu. 

Se sua genialidade musical se devia a este seu tormento interno, ou este tormento interno se agravou devido à sua genialidade musical, acho que ninguém jamais saberá.

Boa leitura. Triste. Cheia de fotos e letras de músicas, com tradução, escritos inacabados e letras inéditas. Acho que para Deborah Curtis, contar sua história foi uma espécie de ponto final em um assunto doloroso. Que bom que ela compartilhou-o conosco. 


sexta-feira, 5 de junho de 2015

[LANÇAMENTO] Stephen King - Finders Keepers (Bill Hodges Trilogy #2)

Por falar em livros..

Saiu essa semana, em 02 de Junho, o segundo livro da trilogia Bill Hodges, iniciada com "Mr. Mercedes" em 2014. Tida como primeira inserção do King no mundo de thrillers policiais (e de trilogias), o livro tem 448 páginas, e sem previsão de lançamento no Brasil. A editora brasileira do King, aqui no Brasil, a Suma de Letras, adiou o lançamento do primeiro livro para 2016, oremos para que o segundo saia em 2017.



À esquerda temos a capa britânica (a que eu achei mais linda!) e à direita, a capa americana


"Finders Keepers" (em tradução livre, "Achado não é Roubado") - um romance magistral e intensamente cheio de suspense sobre um leitor cuja obsessão com um escritor recluso vai longe demais - é um livro sobre o poder das histórias, estrelado pelo mesmo trio de improváveis heróis que King apresentou em Mr. Mercedes.

"Acorde, gênio". Assim se inicia a instantânea fascinante história sobre um vingativo leitor. O gênio é John Rothstein, o icônico autor criador de um famoso personagem, Jimmy Gold, mas que não publica um livro há décadas. Morris Bellamy está furioso, não só porque Rothstein parou de publicar livros, mas porque o inconformado e rebelde Jimmy Gold se vendeu a uma carreira em publicidade, no último livro publicado. Morris mata Rothstein e esvazia o cofre onde ele guardava dinheiro, sim, mas o verdadeiro tesouro são as cadernetas contendo ao menos mais um romance da série Gold.


Morris esconde o dinheiro e as cadernetas, e então é peso por outro crime. Décadas depois, um garoto chamado Pete Saubers encontra o tesouro, e agora é Pete e sua família que Bill Hodges, Holly Gibney e Jerome Robinson deve salvar do cada vez mais desequilibrado e vingativo Morris, quando ele é libertado da prisão, após trinta e cinco anos.


Desde Misery (Louca Obsessão), King não brincava com a noção de um leitor cuja obsessão com um autor se torna perigosa. Finders Keepers é um suspense espetacular, de acelerar o coração, mas é também King escrevendo sobre como a literatura pode forjar uma vida - para o bem, para o mal, para sempre..



Sem me aguentar de ansiedade, é claro que dei meus pulos para conseguir o ebook já no dia lançamento (consegui até um dia antes \o/) e terminei a leitura ontem. 
De certa forma, como sabendo ser o segundo livro de uma trilogia, eu fiquei meio que esperando (ah, as expectativas, essas malvadas!) a presença triunfal de Bill Hodges, Holly Gibney e Jerome Robinson logo no início, me puxando pela mão através de mais um mistério envolvendo loucura, explosões e ritmo vertiginoso o qual tirariam de letra, logo de cara. Só que não.

Finders Keepers oscila capitulos entre presente e passado, tem um ritmo próprio e demora bastante até o link entre as duas histórias realmente se estabelecer. Lógico que logo no início revisitamos a cena do ataque do Mercedes cinzento às pessoas na fila da Feira de Empregos, que é a cena de abertura do Mr. Mercedes, mas tirando esta interligação, a história - pode-se dizer - é avulsa.
Bill Hodges só vem a aparecer na segunda parte do livro (Old Pals), e até lá já rolaram 176 páginas e já estamos imersos em outro ritmo e outras vivências. A narrativa se alterna entre diversos pontos de vista (yey!) e isto eu acho ótimo, porque damos uma olhadela dentro da mentalidade do vilão. A respeito do vilão... o que dizer? ele é louco de pedra! Artigos insistem em traçar um comparativo entre ele e Annie Wilkes (a fã número 1 de Misery) e só o que posso dizer é que, apesar da loucura presente nos dois, enquanto a obsessão de Annie pode até ser considerada pueril e honesta (tipo aquela coisa de solteirona que se deixa envolver em histórias românticas, óbvio que levado às últimas consequências) chegando até a dar dó em certas partes, Morris Bellamy é um adolescente pedante, mesmo ao sair da prisão, aos sessenta anos. Irritante, meio difícil se identificar. Até compreendemos sua loucura, sua revolta e obsessão, mas não dá para se identificar muito. Livro afora, vemos que apesar de inteligente, seu cérebro meio que não evoluiu daquela rebeldia adolescente (qualquer semelhança com O apanhador no Campo de Centeio é mera coincidência?) e do inconformismo pelo seu autor favorito ter pervertido seu herói, transformando-o em um homem conformado e assentado, que trabalha das oito as cinco e tem esposa e uma casinha com cercado branco no quintal. 
A diferença crucial, ao meu ver é que: enquanto Annie idolatra autor E obra, Morris Bellamy pouco se lixa para o autor. Sua paixão é a obra. E isso por si só, já é uma mudança interessante! 
Quando conhecemos Pete Saubers, (o garoto que encontra o tesouro) meio que entramos em outro ritmo da história, vivendo uma típica história de aventura juvenil (cheia de altas aspirações e boas intenções, como os Goonies) e é com um sorriso nos lábios e uma dorzinha no coração que vemos como ele se empenha em "resolver os problemas" pelos quais seus pais passam -- aliás, um adendo: achei as figuras paternas muito alheias à situação no geral... não me convenceu muito também. O garoto passa por longos períodos de sofrimento ético e de auto-suplício por ter talvez tomado uma decisão errada e o medo de ser julgado por isto. Em parte, estas cenas são bem arrastadas - rs, mas sentimos como o garoto foi afetado por tudo o que lhe aconteceu.
No final há o grande embate do bem (Pete) contra o mal (Morris) em uma cena que me remeteu de leve ao embate de Paul Sheldon contra Annie Wilkes.
Uma coisa que eu achei bem legal (ou que pode ser um verdadeiro fracasso, vai depender de como King resolva levar isto adiante) foi o aspecto sobrenatural que ele inseriu, ausente em Mr. Mercedes (não dá para falar muito, senão vai ser um grande spoiler). Mas fica uma bela ponta para o próximo livro, que, segundo o autor em uma entrevista recente, se chamará "The Suicide Prince" [mudou, agora se chamará "End of Watch"].
Que venha!

See you later!